Retiro da lamela o rebuçado azul, que levo à boca num instante e acompanho rapidamente com um trago de água. O sabor do comprimido dança na minha boca, as doses têm aumentado de consulta para consulta, o meu médico diz que é normal, para não me preocupar, que mais adiante vai reduzir a dose e passamos à fase do desmame. Ele insiste em dizer nós, como se fosse um plural terapêutico, mas onde está o nós quando as lágrimas escorrem pelo meu rosto assustado, quando me perco no escuro do meu desespero, onde está esse plural?
Pus baixa, eu e o meu médico achámos que era melhor para mim. Desde que tomo a medicamentação, sinto-me num permanente estado de sonolência, anestesiado perante qualquer reduto de tristeza que me tente assombrar.
Como não posso conduzir, apanho o comboio em Alcântara-Terra e vou sem destino pela linha de comboio, deixo que seja a estação a escolher-me e saio onde se inscreve Carcavelos. Molho os meus pés na areia fina, fecho os olhos e é a ti que te vejo, o esvoaçar do teu cabelo com cheiro a hortelã-pimenta, os teus delicados braços a algemarem a minha cintura e, de repente, esboço aquele sorriso que me ensinaste a fazer. Invade-me o teu cheiro, quase sinto a tua pele a cravar-se na minha e arrepio-me. Uma ligeira brisa traz alguns bagos de areia que me fustiga o rosto, acordo deste sonho vigilante e não te vejo, em teu lugar apenas o ondular da maré que vai subindo.
Tiro o livro que me acompanhou durante a viagem de comboio mas não consigo passar do primeiro parágrafo, as palavras embrulham-se umas nas outras e tornam-se numa mancha negra. Relembro as tuas palavras, as tuas cartas, endereçadas a um amor eterno que nunca chegou a eternizar-se. Apesar de sentir a tua ausência em mim, sinto-me menos só quando saboreio as tuas palavras, que de todas as vezes que as leio, conseguem ter o mesmo travo doce, como se fosse a primeira vez que as desvendasse.
Não confesso a ninguém esta saudade, só a nós, a mim e ao meu médico, tranco os momentos que vivemos de mão dada no canto mais oculto da minha saudade, naquela caixa de madrepérola, com o teu nome cravado a letras douradas. Tento enganar os meus lábios com os beijos de alguém, mas a minha boca está impregnada com teu gosto e apenas disfarço o sabor a ti, com o toque insosso de quem se quer fazer querer. Não me permito ceder, abdicar do meu orgulho e telefonar-te a dizer o quanto me fazes falta nos dias de todos os dias, o quanto nos quero a fantasiar, a sermos um só num corpo macio, a seres o pedaço amputado de mim. Quem voa sabe que nem todos acompanham o seu voo, porque quem voa quer ir sempre mais longe para ficar mais perto do que quer. Agarrei a tua mão para acompanhares o meu voo mas depressa te cansaste e, quando menos esperava, abraçaste o chão e despediste-te de mim.
Levanto-me e caminho pela praia, a maresia acaricia o rasto que vou deixando para trás, quero deitar as lamelas fora, lançar ao mar esta saudade embebida de ti. Nós, eu e o meu médico, chegámos à conclusão que talvez prefira esta sonolência a ter de lutar para te esquecer, para te apagar de mim e limpar os teus vestígios do meu corpo…ou talvez seja por ainda não te querer esquecer!
Pus baixa, eu e o meu médico achámos que era melhor para mim. Desde que tomo a medicamentação, sinto-me num permanente estado de sonolência, anestesiado perante qualquer reduto de tristeza que me tente assombrar.
Como não posso conduzir, apanho o comboio em Alcântara-Terra e vou sem destino pela linha de comboio, deixo que seja a estação a escolher-me e saio onde se inscreve Carcavelos. Molho os meus pés na areia fina, fecho os olhos e é a ti que te vejo, o esvoaçar do teu cabelo com cheiro a hortelã-pimenta, os teus delicados braços a algemarem a minha cintura e, de repente, esboço aquele sorriso que me ensinaste a fazer. Invade-me o teu cheiro, quase sinto a tua pele a cravar-se na minha e arrepio-me. Uma ligeira brisa traz alguns bagos de areia que me fustiga o rosto, acordo deste sonho vigilante e não te vejo, em teu lugar apenas o ondular da maré que vai subindo.
Tiro o livro que me acompanhou durante a viagem de comboio mas não consigo passar do primeiro parágrafo, as palavras embrulham-se umas nas outras e tornam-se numa mancha negra. Relembro as tuas palavras, as tuas cartas, endereçadas a um amor eterno que nunca chegou a eternizar-se. Apesar de sentir a tua ausência em mim, sinto-me menos só quando saboreio as tuas palavras, que de todas as vezes que as leio, conseguem ter o mesmo travo doce, como se fosse a primeira vez que as desvendasse.
Não confesso a ninguém esta saudade, só a nós, a mim e ao meu médico, tranco os momentos que vivemos de mão dada no canto mais oculto da minha saudade, naquela caixa de madrepérola, com o teu nome cravado a letras douradas. Tento enganar os meus lábios com os beijos de alguém, mas a minha boca está impregnada com teu gosto e apenas disfarço o sabor a ti, com o toque insosso de quem se quer fazer querer. Não me permito ceder, abdicar do meu orgulho e telefonar-te a dizer o quanto me fazes falta nos dias de todos os dias, o quanto nos quero a fantasiar, a sermos um só num corpo macio, a seres o pedaço amputado de mim. Quem voa sabe que nem todos acompanham o seu voo, porque quem voa quer ir sempre mais longe para ficar mais perto do que quer. Agarrei a tua mão para acompanhares o meu voo mas depressa te cansaste e, quando menos esperava, abraçaste o chão e despediste-te de mim.
Levanto-me e caminho pela praia, a maresia acaricia o rasto que vou deixando para trás, quero deitar as lamelas fora, lançar ao mar esta saudade embebida de ti. Nós, eu e o meu médico, chegámos à conclusão que talvez prefira esta sonolência a ter de lutar para te esquecer, para te apagar de mim e limpar os teus vestígios do meu corpo…ou talvez seja por ainda não te querer esquecer!
Ainda não descobriu os benefícios da "Murg.", em vez dos comprimidos azuis !!!! Pull my finger :))) Bjs mil
mikado,nao resisto a tua escrita!fantastico.1bjo do baltasar