Lágrimas-de-algodão-doce

As lágrimas sabem-lhe a algodão doce, prometera-se a si próprio que não iria chorar a sua ausência, que não iria sofrer com o seu abandono, por isso, quando as lágrimas lhe caem inadvertidamente pelo rosto, ele convence-se que sabem ao mais doce dos algodões doce.
Fora-lhe apresentada por amigos, numa noite de lua cheia incandescente, em que todas as rosas encarnadas desabrocharam, em que todos os oceanos se tornaram em água doce, soube, nesse mesmo instante, que ela seria o seu amor. Todos os dias que se seguiram foram passados a amá-la, a retê-la entre os seus braços, a segredar-lhe amor pela eternidade enquanto ela, silenciosamente, lhe escapava entre os dedos como areia fina da praia.
E assim se foram passando os dias, entre um toque e foge, entre hipóteses dadas vezes sem conta e, por mais que o tempo passasse, por mais que ele teimassem em retê-la entre os seus sussurros e juras de amor eterno, pouco ou nada restava do que uma mão fechada. Apercebera-se que não chegava amar pelos dois para amparar um amor, porque um amor não se quer coxo, quer-se firme em duas pernas, elevado a quatro mãos, quer-se para ser par porque no amor não há lugar para impares, não há lugar para pés coxinhos ou muletas, para "não sei", "talvez" ou "logo se vê"...
Viu as rosas encarnadas murcharam, os oceanos revoltaram-se e o seu amor, aquele que ele pensara que chegava pelos dois, fora-se definhando, porque o tempo não preenche o nada, apenas o cava mais fundo. E aquele travo amargo na boca e aquela vontade incontrolável de chorar, tornavam-no oco, de olhos baços, de mãos nuas porque no amor não existe espaço para vazios, para mãos que se desprendem uma da outra, para abraços que não se dão, para cartas de amor ridículas que não se escrevem...
Os seus dedos percorriam o rosto dela, tal como um cego, procurando um traço de alegria, mas a sua pele era-lhe áspera ao toque, de traços pesados e sem expressão, o único sinal de vida naquele rosto foi quando os lábios pronunciaram o que ele nunca esperou ouvir, de que já não gostava dele, que não sabia o que era amor mas sabia que o que sentia por ele não era amor. Sentiu-se tão pequenino como a pupila dos olhos amendoados que lhe anunciavam a despedida, ainda sentia a respiração dela junto à sua boca e já tinha saudades, esse sentimento estúpido que é sentido como um murro no estômago, que rouba o ar ao peito, que tira o equilíbrio às pernas, que suga todo o sangue do corpo.
Queria ser pássaro e voar até ao infinito, queria emudecer para não ouvir o seu lamento, queria encerrar os seus olhos para não sentir o seu sal, mas não se tornou pássaro e continuou a viver o dia de todos os dias, não se calou e gritou até a voz lhe doer e abriu bem os olhos para sentir o doce da suas lágrimas, porque qualquer salgado pode ser transformado em algodão doce quando se sabe que se amou com tudo, mesmo quando tenha sido apenas um a amar!

Dedicado a um amigo que pensa que perdeu mas não sabe o quanto ganhou!

Pinto-te

E pensar que um dia foste meu, mesmo sabendo que ninguém é de ninguém, foste um pouco meu no pouco roubado ao tempo, porque bastava-me tocar-te, olhar-te, sentir-te para saber que eras quase meu. Hoje em dia, das poucas vezes que nos cruzamos, olhamo-nos com alguma indiferença, tento manter o meu olhar sobranceiro, para não revelar por momento algum as saudades que tenho de ti, do teu cheiro, da tua pele fundida na minha, dos passeios que dávamos de mão dada, sem nada dizermos, sinto sobretudo falta dos momentos simples que passámos a dois, em que o mundo em nada nos interessava, em que mais ninguém existia para além de nós os dois…saudades de um nós, que ficou preso na voz, que passou a ser impronunciável e no seu lugar emergiu o vazio de um eu e de um tu, de costas voltadas, deixando apenas um trilho de pegadas no chão que cada um decidiu seguir.
Nunca mais consegui estar com alguém como estive contigo, tal como um alquimista tentei perceber a fórmula da nossa paixão, para reproduzi-la, mas os meus esforços foram em vão, todas as fórmulas que encontrei desmancharam-se em segundos, dias, meses, em que me enganei, em que beijei os teus lábios com um outro sabor, em que olhei o teu rosto com um outro perfil. Não tive outra alternativa senão encerrar o laboratório, demiti-me como alquimista, assumi a derrota, percebi que não se esquece quem se quer esquecer, apenas esquecemos quem nos é indiferente, e porque percebi que não se esquece um amor, por mais que o tempo passe, simplesmente aceitei que não te consigo esquecer!
Amo-te em silêncio, elimino toda e qualquer informação desnecessária da minha memória, para ocupá-la com a todas as lembranças de ti e quando fecho os olhos e todos os outros sentidos se apuram, é tão forte a tua imagem, que é como se estivesses ao meu lado, entre os meus dedos, colado à minha retina, apertando-me contra o teu corpo.
Os conselhos dos outros dizem-me para te procurar, para lutar por este amor, mas não consigo, prefiro continuar a olhar-te com uma aparente indiferença, a imaginar-te tal como te quero, tal como te amo, à medida do meu pincel, na dimensão da minha tela, nos tons da minha imaginação...


のぞくトム

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