Morrera-lhe sem aviso

Cada lágrima que derrama é para acalmar o trote apressado das saudades que não passam. Os anos tornaram-nas brasido em vez de cinza e, por mais que chore, essa saudade parece não se querer extinguir. Foi um hábito que se instalou no peito, sem o seu consentimento, essa habituação forçada tornara-a serva de uma saudade que não se dilui com o passar do tempo, antes pelo contrário, aviva-se de vermelho vivo a cada dia que passa.
O sorriso vincado no rosto fora-lhe espoliado, a sua ausência tornara-se demasiado presente para se permitir sorrir e, sorrateiramente, hospedara-se em si um vazio que será jamais preenchido por amor algum. Perdera a vontade de viver quando o som da sua voz tornara-se num murmúrio abafado, quando a textura da expressão dos seus olhos tornara-se numa memória oca, sem esqueleto.
Quando se sente com forças ampara os seus braços, cruzados pela derrota, no parapeito da janela, e lambe com um olhar melancólico os passos das pessoas que passam, não são mais do que vultos, transparentes a uns olhos sem brilho, a uns olhos de quem não vê que todos os rostos que se aprumam diante de si, todos eles, sem excepção, a fazem lembrar quem partiu…

Desde sempre que se lembra de subir àquela árvore (que alguns anos mais tarde soube que era um salgueiro), cujos ramos pendiam sobre o rio que aos seus olhos de menino lhe parecia imenso, emergiam e submergiam tal como amantes que valsam numa arena de pés ligeiros ao som do vento vindo de norte.
Gostava de ficar naquele posto de vigia, sentia-se como um faroleiro atracado numa ilha do atlântico, e vigiava com os seus olhos audazes e curiosos aquele rio, sentia o odor intenso da natureza e deixava-se ficar naquela dormência boa até o céu tingir-se de tons violeta.
Os rapazes da sua idade eram muito diferentes de si, não o compreendiam, ele próprio, muitas vezes, também não se compreendia, sabia que gostava de se aninhar naquela natureza imensa e intensa, sentia-a como um cobertor que o tapava do frio, como álcool que lhe sarava as feridas…

Ela tinha saudades dele, morrera-lhe sem aviso, apenas porque estava cansado da vida, sem razão aparente, ou pelo menos, não encontrava nenhuma explicação suficientemente razoável para compreender o porquê de ter posto termo à sua vida. Essas explicações, inócuas, pouco lhe acalmavam as saudades, não o desculpava por lhe ter legado esta eterna saudade, tão imensa e intensa quanto o rio que o acompanhara em menino.
Hoje em dia, quando a saudade lhe azeda a voz e lhe amachuca por demais o peito, vai até esse mesmo rio, fazendo do seu leito a sua vigília, e sabe-o naquele frondoso salgueiro, tal como um faroleiro que, do alto de onde estiver, a vigia com seus olhos audazes e curiosos e lhe seca cada lágrima que derrama!


のぞくトム

(Voyeurs)

Free Web Site Counter

時間が過ぎるように

(As time goes by)