Pinto-te

E pensar que um dia foste meu, mesmo sabendo que ninguém é de ninguém, foste um pouco meu no pouco roubado ao tempo, porque bastava-me tocar-te, olhar-te, sentir-te para saber que eras quase meu. Hoje em dia, das poucas vezes que nos cruzamos, olhamo-nos com alguma indiferença, tento manter o meu olhar sobranceiro, para não revelar por momento algum as saudades que tenho de ti, do teu cheiro, da tua pele fundida na minha, dos passeios que dávamos de mão dada, sem nada dizermos, sinto sobretudo falta dos momentos simples que passámos a dois, em que o mundo em nada nos interessava, em que mais ninguém existia para além de nós os dois…saudades de um nós, que ficou preso na voz, que passou a ser impronunciável e no seu lugar emergiu o vazio de um eu e de um tu, de costas voltadas, deixando apenas um trilho de pegadas no chão que cada um decidiu seguir.
Nunca mais consegui estar com alguém como estive contigo, tal como um alquimista tentei perceber a fórmula da nossa paixão, para reproduzi-la, mas os meus esforços foram em vão, todas as fórmulas que encontrei desmancharam-se em segundos, dias, meses, em que me enganei, em que beijei os teus lábios com um outro sabor, em que olhei o teu rosto com um outro perfil. Não tive outra alternativa senão encerrar o laboratório, demiti-me como alquimista, assumi a derrota, percebi que não se esquece quem se quer esquecer, apenas esquecemos quem nos é indiferente, e porque percebi que não se esquece um amor, por mais que o tempo passe, simplesmente aceitei que não te consigo esquecer!
Amo-te em silêncio, elimino toda e qualquer informação desnecessária da minha memória, para ocupá-la com a todas as lembranças de ti e quando fecho os olhos e todos os outros sentidos se apuram, é tão forte a tua imagem, que é como se estivesses ao meu lado, entre os meus dedos, colado à minha retina, apertando-me contra o teu corpo.
Os conselhos dos outros dizem-me para te procurar, para lutar por este amor, mas não consigo, prefiro continuar a olhar-te com uma aparente indiferença, a imaginar-te tal como te quero, tal como te amo, à medida do meu pincel, na dimensão da minha tela, nos tons da minha imaginação...

1 Responses to “Pinto-te”

  1. # Anonymous Anónimo

    que escrita!!!e define tao bem o meu estado de alma!!
    é a primeira vez que ca passo mas garanto-te que é o inicio de "um sem fins" de vezes que passarei ca!!
    obrigada por esta momento...
    beijinhos..  

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