Ponto final parágrafo

O tempo passa por mim e quase não lhe sinto o toque, andamos lado a lado e constantemente desencontramo-nos, estou sempre demasiado absorvida com pequenos nadas para lhe prestar atenção. “Olha, afinal não posso ir, estou muito ocupada”, “Desculpa não ter comparecido, mas ando cheia de trabalho!”, expressões que os outros me ensinaram a ouvir e que, com o compasso do tempo, as foi adoptando como minhas, ponto final parágrafo.
E assim vão passando horas, dias, meses e apenas temos tempo para ir no trânsito de Lisboa-Mem Martins e de Mem Martins-Lisboa, a desgastarmo-nos em filas que parecem adormecidas ao longo da IC19. Esquecemo-nos das promessas que fizemos, de que a nossa vida nunca iria ser assim, espartilhada entre quatro paredes, consumida das 9h00 às 17h30 por gente sem vida, cinzenta por apenas saber sentir inveja dos poucos a quem ainda lhes resta cor. Usamos mais a palavra colegas que amigos, escrevemos minutas e não cartas de amor e construímos frases sintéticas “Serve a presente”, “Vimos por este meio”, “Aguarda-se parecer superior sobre assunto em epígrafe”, fazendo duvidar de que ainda sabemos escrever frases como “Gosto tanto de gostar de ti”, “Tenho tantas saudades tuas”, “Beijinhos e muitos abraços”, ponto final parágrafo.
O que é isso de topo da progressão de carreira…chegar ao grau 5 do escalão 10? Não, para mim é mergulhar numa viagem pela América do Sul, de mochila às costas, sem dia de regresso, apenas com a promessa de nos deslumbrarmos e voltarmos a deslumbrar. O infinito passou a ser finito, o horizonte a ser delimitado, tudo tem nomes, nada são coisas, preenchemos o vazio com nomes e esperamos que um qualquer chefe reconheça o nosso esforço e dedicação e nos promova. Vamos perdendo o essencial, tornámo-nos numa pastilha elástica que mascamos vezes sem conta, até lhe perdermos o gosto. Vamos adquirindo bens, adornamo-nos de acessórios, de sonhos fúteis, iguais ao de todas as outras pessoas, ao mesmo tempo que perdemos em identidade, deixamos de sonhar os nossos sonhos, a palavra sonho passa a ser mais um acessórios descartável, ponto final parágrafo.
…mas o tempo que eu não deixo passar, aquele que paga portagem, dá nome aos meus sonhos e faz com que continue à procura de uma mochila suficientemente grande para meter o meu infinito fim e partir de viagem, sem dia de regresso, ponto final parágrafo.

2 Responses to “Ponto final parágrafo”

  1. # Blogger Sandro

    Gosto de gostar de ti...
    Gosto de me sentir no que escreves...
    Gosto de me conduzir pelas tuas pegadas já gastas...
    Gosto de bater na tua janela e saber que me abres a porta...
    Gosto de saber que ainda tenho tempo contigo...
    Gosto de gostar de ti...  

  2. # Anonymous Anónimo

    Perguntaria alguém:
    Por k o "tempo" se não usas o relógio?
    Por K a "mochila" se não usas os sonhos?
    Por K o "ponto" se não usas os parágrafos?

    PS: A felicidade é um horizonte infinito e segundo consta não se consegue alcançar indo pela IC19.  

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