In My Eyes

Não há tempo para lamentos, há que secar as lágrimas e seguir em frente mesmo que não se saiba para onde!
É urgente despir-me dos sonhos que sempre sonhei, desvirtuá-los até me mentalizar da sua intangibilidade, entrar em rota de colisão com esta matéria inorgânica que já não me pertence, que apenas me fora emprestada por um curto período de tempo, urge tornar-me numa pessoa séria à séria, porque de outra forma não vou conseguir seguir em frente!
Queria o melhor dos dois mundos, manter o ninho, o amparo do colo, o sussurrar ao ouvido que amanhã tudo será diferente, que sou por demais linda e tranquilizar-me apenas com a doçura destas palavras, queria manter aquele alguém que me segura a mão quando choro, que sara todas as minhas feridas apenas com beijos, que baixa a minha febre apenas com um afago na testa, queria tudo isto e ao mesmo tempo ser o adulto que me tornei. Mas estou a aprender que não se pode ter o melhor destes dois mundos, que tenho que seguir em frente e aceitar tudo aquilo que sou, sem amparo, sem afagos, sem sussurros, amputada do ninho, e contar apenas comigo. Uma pessoa séria à séria, espoliada dos seus sonhos, com a dolorosa sensação de que tudo se tornou irreversível, o que se parte não mais poderá mais ser colado, o que se descoseu não mais poderá ser cosido e a quem se magoou não mais nos perdoará, mesmo pedindo-lhe desculpa…
Damos por nós a preferir o anzol de duas pontas aguçadas preso na garganta ao amparo interrompido na nossa própria lembrança.
A ousadia é substituída pela dormência, pensei-me ousada mas dou por mim a baixar por demasiadas vezes os braços, a virar por demasiadas vezes as costas. Aquela ânsia de revolta é açaimada e voluntariamente colocou-me a mim própria o carimbo do conformismo, tento adormecer os meus idealismos e convencer-me que tenho de tornar-me pragmática, empenhada em pertencer a esta realidade feita de desígnios alheios, feita de papel machê cuspido por todos os hipócritas.
E lá vamos preferindo o conforto do sofá ao melaço da lama.
Vejo agora que o tempo passa, que mesmo aparentando estar parado, ele move-se silenciosamente, como predador que observa a sua presa, e mesmo quando parece mastigar-se, mesmo quando os dias parecem semelhantes entre si, o tempo passa, camuflado, esbatido, e esse é o tempo mais feroz, aquele que abocanha pela calada e deixa uma marca indelével.
Acordo, adormeço, como, bebo, peso-me, sei-me mais pesada, olho-me ao espelho e continuo a ver aquela miúda assustada, com medo das gentes, a preferir encolher os seus afectos a vê-los expostos aos círculos de feras. O loiro trigo deu lugar a dois ou três cabelos brancos, alguns vincos dão expressão ao rosto, reconheço-me nos olhos, esse sim continuam a ser os mesmos, sem a marca indelével do tempo, assustam-me por ainda não lhes terem sido espoliados os seus sonhos, por ainda acreditarem nessa criança, por ousarem não se fecharem e por ainda preferirem o melaço da lama ao conforto do sofá.
Mas não há tempo para lamentos, há que secar as lágrimas e seguir em frente mesmo que não se saiba para onde!

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